Não gosto muito quando vais embora. Prefiro quando estás, melhor ainda prefiro quando chegas, pois aquele instante é o momento mais distante da tua hora de ir embora, não gosto quando vais, por que não fostes feita de partidas, tens aroma de chegadas, de lugares que ainda tenho que conhecer, daquele porto na Havana, onde hei de escrever algo sobre ti(para ti, que no fim é a mesma coisa).
Estou lá sentado, a pena empunhada, os olhos refletindo o por do sol enquanto divisam os barcos pesqueiros, ouvindo as canções que Sílvio Rodríguez escreveu para que eu aceitasse que sou parte deste mundo, e não de outro.Comigo, a minha pele, meus ossos e sonhos, a pena, o papel e uma garrafa vazia da bebida mais forte que me atrevi a me atrever. Estás ouvindo o som das aves, o ruído tranqüilo do fim do dia, as coisas que estou escrevendo? Estás ouvindo o som da minha voz, da minha risada nervosa, te falando das ruas de uma cidade revolucionaria?
Olho pro lado, a pena estanca. Meus olhos se perdem nos teus, sim teus olhos, ali adormecidos nos meus( sabes que gosto de te ver dormir). Quase digo tudo o que estava emprestando ao papel, subitamente me volto tímido, giro com meus olhos( grandes em demasia) buscando novamente o porto seguro da folha, e a pena recomeça, primeiro lenta, depois voraz, sei que estás me olhando ainda, sinto teus olhos encarando meus dedos ferozes.
Os barcos no horizonte cessam seu incessante velejar, e o por do sol fica ali parado só para nós, coloco meus braços ao redor de ti, ainda estás comigo, sinto tua pele, e rio ao pensar que o mundo às vezes nos leva aonde queremos ir.Enrolo o papel ainda quente de ti ter descrita, e abro a garrafa com cuidado, despejo as ultimas gotas na minha garganta e deposito com cuidado( quase com uma carícia) aquela promessa que hoje te faço, a garrafa beija a água e a cena até então eterna se desfaz e sem motivos aparentes o universo continua. Estás ouvindo? Estás lendo a carta que escrevi? Estás naquele porto, vendo a vida que havia um dia de chegar?
Sinto que sim, te vejo lá, e isso já é o bastante para que estejas, mesmo que não estejas jamais, mesmo que nunca. Agora o entardecer se despediu, a noite lenta, caiu com velocidade astronômica e cobriu com seu véu as coisas todas, ainda estamos no mesmo lugar( afinal, onde teríamos ido?) e encaramos as estrelas tentando decidir se elas nos encaram de volta.
Torço pra que chova, quero estrelas chovendo em mim, ou melhor, quero que elas chovam em ti, para que eu tenha certeza de que estás ali. Sinto uma gota, de um repente outra, um aguaceiro desaba sobre nós, acima, no entanto, nenhuma nuvem reluz, com o gosto da chuva, teus dedos nos meus e o aroma do teu beijo, fecho os olhos, enquanto aperto com força tuas mãos. Sim, estás lá, estamos lá, e estaremos lá eternamente, estás vendo? Podes me ver? A noite acabou, as luzes do mundo se apagam, eu te dou boa noite e te vejo ir embora. Não gosto quando vais embora, prefiro quando estás.
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